Humanize ou fique fora do jogo

No Clima
10 min readJan 5, 2024

--

Em Humana

Por marcas mais humanas

Consumidores são humanos, pessoas reais. Óbvio demais, né? Sei que você não veio aqui pra ler só isso. Mas, então… por que raios as marcas continuam tratando as pessoas como uma massa amorfa, que vai comprar qualquer posicionamento amplo e sem graça? Por que vemos, cada vez mais, um movimento de blanding se intensificando, resultando em marcas sem personalidade e genéricas?

Talvez seja complexo dizer em qual momento começamos a nos preocupar com a criação de estratégias humanizadoras das marcas. Pode ter sido em algum momento quando a internet ganhava tração e todas as marcas buscavam entender qual seria sua maneira de funcionar em um universo online; pode ter sido quando entendemos que as mídias sociais teriam um impacto fundamental na construção das nossas relações de consumo; ou ainda, inclusive, no recente boom de novas tecnologias — inteligências artificiais, metaverso e toda a sorte de futuros possíveis, impossíveis e inimagináveis que nos abriram mil e uma possibilidades de pensar nossas relações com as marcas — e, por consequência, mil e uma dúvidas de como colocar novas estratégias em prática.

Photo by Yuyang Liu on Unsplash

Se as pessoas são humanas, não seria hora das marcas se provocarem e questionarem a natureza das suas relações? Que tipo de conexão queremos — enquanto consumidores — estabelecer com as marcas? O que estamos esperando dessas marcas? E, afinal de contas, marcas precisam ser “humanas” mesmo? E o que isso significa, na real?

Esse não é um artigo de “como fazer sua marca se tornar mais humanizada” — mas uma provocação sobre as construções das nossas estratégias de branding, num cenário em que as discussões parecem somente passar por quais ferramentas mágicas de inteligência artificial podemos incorporar ao nosso negócio para ganhar mais eficiência, agilidade e tomar as melhores decisões.

Branding é sobre pessoas

Pensar em relações e estratégias de marcas pode ser algo um tanto quanto complexo. Afinal de contas, não há uma fórmula mágica nem resposta certa para construir uma marca. E, quando incluímos a variável mais importante, as pessoas, tudo fica mais embolado. Não há lista num blog post de “como fazer” que resolva os problemas únicos e exclusivos da sua marca e nem te diga como entender as pessoas, na real.

Por isso, mais do que mapear e aplicar as mais novas tendências disso ou aquilo, precisamos nos voltar para as pessoas e entender o que elas realmente querem. Quando vamos ao supermercado e passamos pelo tedioso processo de escolher uma meia dúzia de produtos em gôndolas intermináveis, um exemplo claro pula bem na nossa cara: porque escolhemos a marca A em detrimento da B?

“Branding é uma manifestação profunda do espírito humano”.

Essa frase da especialista em branding Debbie Millman (recomendamos muito o livro dela Brand Thinking and other noble pursuits) traduz, de forma simples e objetiva, o que acreditamos: branding, em última instância, é e sempre foi sobre pessoas.

É sempre importante ressaltar que marcas são instrumentos de construção de identidade — elas carregam mensagens, símbolos que nos ajudam a nos situar no mundo. Para além disso, Debbie — no vídeo abaixo — ainda nos provoca a pensar sobre os paradigmas das mudanças de comportamento das pessoas — e como isso impacta o mercado e sua experiência.

Papo com Debbie Millman para o Branding na Real

Muito mais do que satisfazer uma necessidade básica e funcional, as pessoas esperam que as marcas as ajudem a navegar no mundo, gerando significado e pertencimento. E isso nos incita a repensar a forma com que as marcas se relacionam com seus consumidores.

Humanizar uma marca parte da premissa de que, no fim do dia, temos que nos lembrar que do outro lado da tela, da loja ou de qualquer ponto de contato da sua marca, tem uma pessoa. E pessoas querem ser tratadas como pessoas (óbvio, né?) — indivíduos únicos e com um conjunto de valores específicos — que querem ter as suas relações mediadas por esses valores. Existe um fator importante na construção de relacionamentos verdadeiros e reais que ajuda a criar laços mais duradouros.

Espelho, espelho meu…o que essa marca tem a dizer sobre mim?

Humanizar uma marca não passa somente por ter um atendimento descolado no chat de atendimento, um avatar 3D ou um manual de marca com tom de voz que garante “somos humanos”.

Ainda que esses exemplos ajudem a tangibilizar parte dessa experiência humanizadora, humanizar é sobre entender e incorporar, de fato, os aspectos humanos daquela marca, de forma holística e completa.

É mais do que falar — é agir em toda a cadeia de valor. Personificar a marca em um embaixador (virtual ou não), utilizar de um tom de voz mais conversacional, trazer o humor e soluções inovadoras, criativas, ousadas e imprevisíveis são maneiras eficientes de sair de um “corporativês” que tende a afastar as pessoas.

Nenhuma marca quer ser percebida como robótica, fria, dura, asséptica. Por isso, criar experiências memoráveis e significativas com as pessoas se torna fundamental nessa jornada de humanização.

Mas, antes de tudo, é preciso uma boa dose de “terapia”: quem é a marca, qual seu papel no mundo, como ela se relaciona com as pessoas, qual o jeito que se comunica, o que fala, quais as suas crenças, lutas, bandeiras e seus valores.

É sobre entender quais são suas características mais fundamentais e únicas para entender seu lugar no mundo — e, por consequência, como nos relacionamos com as pessoas. Porém, entender isso não significa necessariamente que a construção de uma marca humanizada está completa.

É preciso criar uma estratégia de marca coesa, robusta, coerente e bem planejada.

Como diz sua mãe, “você não é todo mundo…”

Personalização, humanização e empatia não são táticas a serem experimentadas isoladamente, mas componentes importantes de um mix estratégico que as marcas podem usar para atender às expectativas do consumidor.

Um bom exemplo são as “anti-marcas” — como a Liquid Death, Desgosto, Aff the Hype, Not Co., Karen’s Diner — que brincam com a antítese e “negativos” como central na definição da sua personalidade — porque, vamos combinar… ninguém gosta só dos bonzinhos, né?

Ao trazer pro debate sentimentos pouco explorados, conseguem criar conexões mais verdadeiras com as pessoas do outro lado — no fim do dia, não existe vida que lembre um comercial de margarina…

Buscar o que nos torna únicos de fato é um grande desafio, mas um esforço que vale a pena. Afinal, ser humano é o que nos diferencia. É sobre ser uma marca real, que tem conversas reais e entende a vida como ela é, sem floreios pra criar um mundo utópico e distante da realidade.

Talvez, por isso, tenhamos achado nas estratégias de humanização uma saída para mudar a perspectiva de como fazemos negócio, colocando a pessoa em evidência; e que faz com que a gente repense o que fazemos e, mais ainda, como podemos potencializar a ideia de propósito de marca como ponte fundamental na construção de valor e de relações mais significativas e únicas, diferenciadas.

Isso, claro, complexifica nosso trabalho — afinal de contas, como dar conta de tanta personalização e necessidade de individualidades enquanto criamos uma marca glocal (global e local), que precisa se expandir, crescer e, ao mesmo tempo, se manter fiel às suas raízes para não se tornar só mais uma?

Todo mundo quer pertencer a algo exclusivo

Talvez não seja novidade pra você que os consumidores queiram se relacionar com marcas que tenham os seus valores, que compartilham da mesma visão de mundo e na qual confiam, tampouco, deve ser uma grande revelação o fato de que as pessoas se importam mais do que somente com o preço na hora de consumir uma marca.

Assim como na vida pessoal, onde precisamos construir um relacionamento de confiança com um amigo para que aquela relação evolua e se torne mútua, as marcas precisam fazer o mesmo para demonstrar o seu valor.

Com uma oferta crescente de marcas, o preço e relação custo-benefício transacional não são os únicos fatores que pesam na decisão dos consumidores: a experiência gera credibilidade, confiabilidade e tangibiliza os atributos únicos da marca.

Se você é uma pessoa de dados, talvez essa breve lista te dê um bom insight do que estamos falando:

90% dos consumidores sentem que valores são importantes quando escolhem uma marca (ShoppingGives).

83% dos consumidores brasileiros preferem comprar de empresas que defendem propósitos alinhados aos seus valores de vida. (Accenture | Global Consumer Pulse)

34% boicotaram marcas pelo menos uma vez porque não se sentiram representadas nas propagandas ou ações das empresas. (Adobe)

72% dos consumidores acham que o diálogo entre marcas (nutrir diálogos e conexões), causas e consumidores deve ser mais estimulado. (Opinion Box)

Antes de buscar soluções que façam sentido para os seus consumidores, as marcas precisam entender o seu lugar no mundo e o que elas estão fazendo para transformar essa realidade em uma ferramenta de conexão e diferenciação com o seu consumidor.

Trendsetters

Essa necessidade de diferenciação é chave para qualquer marca. É um dos aspectos que ajudam os consumidores a escolherem suas marcas favoritas. A construção de uma identidade consumidor-marca é um processo ativo, seletivo e psicológico no qual os consumidores comparam sua própria identidade com a da companhia e se identificam com ela, se ela puder entregar uma ou mais necessidades de auto-diferenciação. Quanto mais relevante, conectada aos seus valores, melhor.

A Nubank, por exemplo, conseguiu redefinir a experiência de atendimento, com os seus quatro pilares (antecipar, resolver, se importar, empoderar) e baseou todo o seu atendimento de forma humana e empática.

Inclusive, um dos seus produtos não bancários, o NuDog (um cartão de crédito de silicone, feito em parceria com a Zeedog), veio de uma experiência bastante real: os cachorros tendem a comer cartões de crédito. De forma criativa, a marca “resolveu” o problema dos mais de 10.000 mil clientes que entraram em contato com o seu atendimento.

Nudog: O “cartão de crédito” da Nubank que seu pet pode destruir.

A Netflix trouxe o bom humor nas suas postagens do Twitter, criando uma forma de se relacionar, trocar ideias e responder seus seguidores antes pouco utilizados no mercado.

A Patagonia, marca de roupas esportivas, já traz pessoas reais usando os seus produtos em suas campanhas publicitárias há mais de 30 anos. Além disso, criou um grupo de especialistas da marca

(Worn Wears) que realizam excursões em diversos países para realizar o reparo em roupas de qualquer marca para prolongar a vida útil da peça e auxiliar quem não quer ou não pode ter acesso a outras peças.

Experiências humanizadas costumam se tornar benchs quase imediatos: quando uma companhia não te trata como um robô, as pessoas tendem a valorizar e gostar disso.

Entender que não queremos ficar 2 horas ao telefone pra resolver algo simples no banco, que queremos comentar e brincar com as marcas (especialmente as que nos fornecem entretenimento), que precisamos que nossas roupas durem sem deixar de ter consciência com a questão da sustentabilidade, fez com que essas marcas construíssem estratégias inovadoras e diferenciais únicos, que provêm da sua visão de mundo — e de como as pessoas que fazem parte daquela comunidade entendem esse mesmo mundo; e o que elas esperam das marcas nesse ecossistema.

Humanizar a marca não é questão de surfar em uma tendência, estar na moda ou parte de uma estratégia online. Humanizar é o processo que garante o futuro do negócio, a conexão com as pessoas e a lealdade entre os consumidores.

Mas e a tecnologia no meio disso tudo? Dá pra ser humano e digital?

As fronteiras entre o físico e o digital estão se borrando cada vez mais.

Já começamos a discutir conceitos como Phygital (mistura de physical e digital, do inglês) para se referir ao mundo em que estamos vivendo. Com a proliferação de novas tecnologias (como inteligências artificiais) que vão mudar nosso jeito de viver, de consumir e estar em todos os nossos pontos de contato com o mundo, existe maneira de se manter humano, fiel a quem você é?

Muitas pessoas pensam na evolução tecnológica como algo diametralmente oposto ao fator humano. Pelo contrário, ao criar novas experiências mediadas por tecnologias, se faz mais necessário voltar ao que nos torna humanos. Já parou pra reparar que as gravações de telemarketing reproduzem falas mais realistas, trazendo até um barulho de digitação no teclado?

E que as assistentes virtuais, como Siri e Alexa, têm estado cada vez mais próximas do que imaginamos nos filmes como Her e os filmes da Marvel, com o Jarvis, por exemplo? Mais fluidez, mais trocas significativas. Afinal de contas, queremos a eficiência e agilidade em alguns momentos, mas nada substitui a interação humana.

Humanizar passa a se tornar uma ferramenta ainda mais útil nesse lugar — é onde podemos explorar aspectos emocionais mais profundos, storytelling e explorar as conexões num nível mais profundo de marca.

Para refletir

Então, pare e pense, você sabe quem é a sua marca? O que a faz única? E quais as estratégias a tornam a mais humana, sem bullshit?

Você comunica seus diferencias de forma clara e sabe usá-los de forma única com o seu público?

A experiência que você oferece para seus consumidores fortalece uma conexão verdadeira com eles?

Você ouve e entende, na prática, o que o seu público quer dizer?

Se a resposta para alguma dessas perguntas for não, precisamos marcar um café com urgência…

--

--

No Clima
No Clima

Written by No Clima

Consultoria criativa de Branding. Acreditamos em criar marcas reais, à prova de futuro. Somos apaixonados por branding! #brandingpravida.

No responses yet